sábado, 26 de julho de 2008
Entrevista / Genézio de Barros
O dito e o não dito
Genézio: memórias da infância na criação de Modesto
© Iatã Canabrava
Para criar o personagem Modesto, Genézio se valeu não só da preparação que elenco e diretor tiveram em uma fazenda de Itu, onde o filme foi rodado, mas também de sua própria experiência de infância. “Eu sou desta região. Minha família é do interior paulista, meu avô foi tropeiro. Muito por isso, conheço muito bem este universo. Cresci ouvindo os vaqueiros, os tropeiros, os matutos”. Ator formado pela Escola de Arte Dramática da USP, Genézio tem vasta experiência no teatro e também integrou o Grupo TAPA. Entre seus principais trabalhos no palco, estão Inimigos de Classe (vencedor do Prêmio Mambembe, 1985), Ivanov (ganhador do Prêmio Mambembe, 1998).
Cada vez mais presente em várias produções da TV brasileira, como a novela A Favorita (Rede Globo), em que interpreta o personagem Pedro, pai de Flora (Patrícia Pillar), Genézio também é ator com vasto currículo no cinema. Entre seus principais trabalhos, estão os longas Ação entre Amigos, de Beto Brant, que lhe rendeu o Prêmio de Melhor Ator Coadjuvante no Festival de Chicago (1998); Quase Nada, de Sérgio Rezende (2000), e Achados e Perdidos, de José Joffily (2005).
Você é um ator com vasta experiência tanto no cinema quanto no teatro, palcos em que já viveu personagens simbólicos do caráter do brasileiro. Como foi desta vez dar vida ao matuto, ao brasileiro que vive nas terras remotas do País? Foi difícil adentrar este universo?
Sim e não. Sim porque este universo é sempre complexo e fascinante. Corre-se sempre o risco de cair no folclórico quando se fala do sertanejo. Mas, ao mesmo tempo, este é um mundo que eu conheço de perto e que admiro. Cresci no interior de São Paulo. Meu avô, um imigrante italiano, era tropeiro. Convivi desde sempre com o caipira. E conheço bem o modo de agir e de falar. Olho de Boi foi uma bela forma de eu voltar a este universo de minha infância.
Este é um filme de personagens que têm poucas palavras, mas, ao mesmo tempo, matutam muito. O trabalho interior para criar Modesto foi baseado nesta idéia?
Exato. Este é um mundo do silêncio. Não é que as pessoas não se falem, mas se falam com mais pausas. Pensam muito. Falam pouco. Há um grande diálogo interno que permeia estas relações, que são desprovidas de artificialismo. São autênticas em sua maioria. E a prosódia, o modo de falar e de pensar de Cirineu e Modesto é muito importante para o desenrolar da história. Ao mesmo tempo que há cenas muito cinematográficas, há este aspecto teatral da palavra que é muito forte em Olho de Boi. São dois personagens apenas em poucos cenários. Há a igreja, o trajeto que eles percorrem e o local onde fazem a tocaia. Tudo é muito econômico.
Olho de Boi é um filme que valoriza o trabalho criativo dos atores.
De fato. Como o roteiro nasceu do teatro e foi escrito por um ator, esta valorização é natural. Hermano Penna é um diretor que tradicionalmente gosta de trabalhar com atores, de valorizá-los. E isso fica muito claro em Olho de Boi. Não é um filme fácil. É um filme teatral em vários sentidos. Mas é por isso que eu gosto do resultado. Entre outras coisas, vai na corrente oposta desta onda de filmes de ‘bandido e polícia’ por que tem passado o cinema brasileiro. Esta variedade é necessária.
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